quinta-feira, 14 de novembro de 2013

ENTREVISTANDO O DIMENOR.


Muito se tem falado sobre o Dimenor. Sua ferocidade crescente, seu modos de zombar da sociedade, seu futuro de banditismo ou morte em “ação”, e de suas inimputabilidades (êita...). Mas nunca se soube o que ele pensa a respeito disso tudo. Pois tive uma chance de entrevistalo e não a perdi. Abaixo, os principais trechos da conversa, em off, naturalmente.

- “Dimenor, me conte sobre você. O que você quiser. Mas não esconda sobre seus motivos e nem sobre o que você espera do futuro”.

-“Pois é, Senhor, (Dimenor tem essa mania de chamar todo de senhor e senhora quando está desarmado), eu sou um sujeito de paz. Não gosto de violência e nem me meto em furadas. A não ser que seja preciso”.

-“Mas como assim, dizem que você assalta, estupra, até mata à toa...Muitas vezes você aparece nas câmeras de segurança, ameaçando e batendo em pessoas indefesas. Isso é ser pacífico ?”

- “Senhor, isso é modo de agir no meu trabalho. Se não fizer isso, ninguém bota fé. E meu ganho se perde. Sacumé, né ?”

-“Como assim “trabalho” ? Assaltar é trabalho em seu modo de pensar?”

-“Pois foi assim que aprendi, uai. No começo até trabalhei pra um traficante. Tinha uns treze anos. Era só pegar o bagulho e entregar pro cliente. Sobrava um troco legal. Até bicicleta eu comprei. Fora que ajudava minha mãe a comprar comida pra casa. Depois foi ficando mais difícil. Muita concorrência, sacumé ? Muitos outros dimenores na parada, e os clientes nem pagavam direito. Até que tive que cobrar com o ferro na mão. Mas não foi legal. Matar amigos por causa de grana não está certo, né ?”

-“Mas não tinha outra coisa pra fazer ? Estudar, por exemplo ? A Escola é grátis, material, merenda , uniforme, condução.”

- “É verdade. Tudo grátis. Menos roupa, sapato, celular, som. As minas precisam receber pra transar com a gente. Não digo as putinhas. Mas as namoradas. Se não tem uma presença, um presentinho, um lanche, uma curtida na praia, qual vai querer o estudante aqui ?”

-“E seu pai? Não podia ajudar com essas coisas ?”

-“Qual...ele não vence de ganhar nem pra cervejas que toma...E nem sei onde ele anda. Minha mãe botou ele pra fora de casa. Vivia bêbado e desempregado.”

-“Mas to vendo que você fala bem. Onde aprendeu ?”

-“Olha, senhor, eu frequentei escola te os quinze anos. E até gosto de ler. Mas ví que não ia dar em nada. Ai, juntei com uns valentes que já faziam os ganhos na vida e larguei tudo. Na primeira vez levantei quase quinhentão. Aluguei um ferro trezoitão e fui pra vida. Hoje tenho até moto e casa própria. Tá no nome de minha tia que é pra não perder se eu morrer dia desses.”

“- Ah, Você sabe que pode morrer na ação ? “

- “Não. Mas tem policia que prende e depois mata. Tive amigos que morreram assim. Fora que companheiros mesmo podem querer armar uma treta. Ai já era, né ?”

- “E você já foi preso alguma vez ?”

-” Claro. Mas logo soltam a gente. É só não aprontar lá dentro que botam você na rua. Pra tudo tem jeito.”

- “E o futuro ? Você pensa nele ?”

- “Claro. Ainda mais agora que nasceu minha filha. Quero dar tudo pra ela. A mãe dela é meio galinha, mas sabe que se eu a pegar nas quebradas com outro vai perder a filha e o bolsa família. Fora que de mim não leva mais nada. Entrego a menina pra minha mãe criar e pronto. Minha mãe sabe como criar filhos direitinho. Já criou quatro. Comigo cinco, né ?”

- “Dimenor, eu não sei se nos encontraremos novamente, mas espero que você encontre um modo menos violento de ganhar a vida. E que eu não seja um “cliente seu”, certo ?”

- “Senhor, logo vou fazer dezoito. Ai já pensei em sair dessa. Tô pensando em montar um negócio certo, tudo na lei. Até guardo uma grana de cada ganho pra fazer essa loja.”

- “Loja do que ?”

-“Não sei, mas vejo que tem gente que vai comprar coisas em Feira de Santana e vende pro povão. O problema são os assaltos. (Risos) . Mas, se Deus quiser vou conseguir. Te até um pastor me orientando pra isso.”

Esta entrevista tem ares de ficção, mas é resultado de um papo reto que tive com um garoto que conheci num Lotação. Paramos meia hora na Praça ACM e depois cada um foi pro seu lado fazer o ganho, conforme sabemos fazer.  A redação foi feita de memória.

Certamente haverá outros DIMENORES semelhantes no pais inteiro. Claro que nem todos com o mesmo histórico, mas, sem dúvida, nada muito diferente desse, que chamarei de Jociclei